domingo, 11 de fevereiro de 2024

Meu primeiro Podcast. Vamos refletir - Episódio 1 - Eu e o abuso Sexual. Minha história.

 



Publiquei meu primeiro podcast.

Neste primeiro episódio, me apresento e relato a minha vivência e ponto de vista pessoal com a questão do abuso sexual.
Segue o link para acesso no Spotify:

https://open.spotify.com/episode/4yl0JU2OqLoFEFd0pfVdhL?si=6b56e40bc73042b7

O PARCEIRO IDEAL

 


É complicado deixar uma receita onde cada pessoa tem ingredientes diferentes mas, quando pensamos no casamento, durante nossa vida, vamos imaginando um monte de coisas. Nossa casa, nossos filhos, quando o desejamos é claro, ... nossos pets, nossa cozinha, a sala de estar, o momento de chegar no conforto do lar, as refeições, às vezes até pensamos com carinho sobre os cuidados com o parceiro,... sua jantinha, o café da manhã de domingo, porém, vida de casado está mais para um grande contrato do que um sonho de liberdade.

Os defeitos do outro que incomodam quando nos conhecemos ao longo do relacionamento, se tornam uma pedra no sapato, que se você não tirar vai te causar uma inflamação daquelas, que ficam latejando por muito tempo, sem te deixar pensar em outra coisa, apenas na dor.

Nada melhor que começarmos com a principal dica:

• Escolha um companheiro que você consiga dialogar.

É muito importante que os problemas sejam conversados, a briga as vezes é mais emocionante, e tem gente que conta logo com a reconciliação pra ter alguma emoção, principalmente quando o relacionamento já não vem tendo essa emoção em outros momentos, porém, a briga sempre deixa marcas, quando não temos a paciência pra refletir no que vamos entregar em forma de palavras para o próximo, e digo mais, isso não só no casamento, mas na vida. A emoção nos permite "botar pra fora". O problema disso, é a marca do que a emoção causa, grava no próximo não apenas a reflexão das palavras mas, junto com elas, a agressão da raiva, da indignação, e muitas vezes, da agressão física. Tem muitos assuntos que precisam de carinho para que sejam aceitos, a imposição é normalmente a pior maneira de se tentar uma conquista, você até consegue conquistar algo, mas quando alguém te faz algo por imposição, a não ser que seja um fetiche, a marca vai estar ali sempre como um gatilho, esperando pra te devolver o sentimento ruim que ficou entalado na garganta.

Segunda dica:

• Respeite o tempo do seu parceiro.

Tem gente que precisa de tempo para refletir, a resposta momentânea na maioria das vezes, não é verdadeira. Quantas vezes não disse algo que se arrependeu em segundos? É exatamente isso que estou dizendo. Se permita, mesmo que seja aqueles pequenos segundos, que normalmente tampamos a boca e olhamos para o nada tentando saber se estamos certos ou não, antes de responder.

E se o seu parceiro lhe disser, não consigo conversar agora, estou muito nervoso ou, nervosa? Respeite! Essas pessoas não sabem refletir em pouco tempo, instantes então, nem se fala, não tente forçar a barra, pode ser uma porta aberta para a agressão, então diga: Quando puder conversar, saiba que estou esperando, e, espere de verdade. Se esse momento do diálogo não chegar, é a hora de você refletir sobre essa parceria e sua importância. Ah! Vale lembrar que não estou falando do quanto é importante para alguém e sim, pra você mesmo! Se não valorizaram a pessoa que é, ninguém fará isso por você, seja o exemplo.

Terceira dica:

• Espaço.

Duas pessoas ao se unirem não se tornam uma. No começo da relação, muitas pessoas exigem parceria. É muito fácil ouvir: Casei com você pra que fosse companheiro nisso ou naquilo. Está aí um grande erro! Você deve ser auto suficiente, ter suas metas, seus planos, sua vida e, o parceiro é exatamente isso, um parceiro! Veja como um negócio, eu tenho uma loja e preciso de um vendedor, pague bem, dê condições boas de trabalho e terá de volta um bom vendedor. No casamento se você alimentar com respeito, honestidade, lealdade e o que mais seu parceiro necessitar, se tiver escolhido bem, terá em troca uma excelente parceria.

Quarta:

• Saiba ouvir.

Ouvir é muito importante, eu por exemplo, sempre falei pelos cotovelos, é muito fácil estar pensando no que quero dizer enquanto o outro está desabafando suas necessidades. A questão é que não ouvir, lhe coloca na situação de não saber e, se não souber, como vai respeitar as necessidades do seu parceiro para que ele também respeite as suas?

Quinta:

• Não tem resposta? Não responda!

O melhor é dizer: Não sei, posso pensar no assunto?

Porque?

Por que dar qualquer resposta causa uma esperança no seu parceiro, então, você pode prometer algo que não vai cumprir? Ou que vai causar um gatilho de raiva porque respondeu sem pensar?

Não se comprometa se não puder e quiser cumprir.

Depois dessas dicas bem básicas, quero complementar com mais uma.

• Papel e caneta e lá vamos nós: Anote tudo que espera e não quer desta parceria.

Coloque tudo que te incomoda, tudo que espera do seu parceiro, tudo que sonha realizar, casa ou sítio, filhos, pets, a organização do lar, uso do banheiro, obrigações de cada um, o que você aceita e o que você não aceita, que sua lista seja bem longa, peça ao seu parceiro para fazer o mesmo, depois disso, sentem e tenham tempo para discutir cada uma das anotações, mesmo que isso leve dias, afinal, o que quero deixar bem claro aqui é que, reformar, da muito mais trabalho que construir.

Reforme-se eternamente se isso lhe trouxer melhoras. Evolua!

Construa uma parceria forte e terá um casamento perfeito, não tente ser esperta ou esperto usando seu parceiro, tudo que você faz, o universo se encarrega de trazer de volta. Seja parceiro para que tenha um parceiro também e o principal, desista se não te fizer bem, não desperdice sua vida, ela é muito valiosa pra ser descartada por quem não te merece.

Leva muito tempo para se reconstruir, mas, todo ser humano tem esse poder de se reformar e isso não depende de ninguém, só de você.

Outra coisa que acho importante deixar claro, quando falo sobre agressão, não estou dizendo sobre agressão física apenas, mas também da agressão verbal, da agressão de palavras ou apenas no tom de voz, não percebemos, quando estamos nervosos o quão alto gritamos para expressar sentimentos e isso passa despercebido quando é dito, porém, quando ouvimos não é assim. Dói, machuca e grava causando danos que podem levar anos para serem apagados então, vamos cuidar para não causar danos no próximo.

Lembrando pra ficar gravado...

Respeitar, dar espaço e ter o seu espaco, refletir sempre e dialogar, ser parceiro para ter um parceiro e reformar-se sempre para evoluir.


quinta-feira, 22 de setembro de 2022

Saiba identificar a depressão

A depressão é um transtorno psicológico.
Antes de tudo, precisamos entender o que é a depressão.
Muitas dores são confundidas as vezes com depressão, a perda de um ente querido, uma separação, problemas financeiros causam tristeza, mas, a depressão tem sintomas que quanto antes diagnosticados mais eficaz será o tratamento.
Sintomas comuns como desânimo, falta de energia, desesperança, choro fácil, estado emocional desequilibrado, pensamentos autodepreciativos, descontrole alimentar, distúrbios de sono como insônia ou hipersonia, apatia, perda de interesse sobre qualquer atividade que antes era importante, entre outros.
Nunca sabemos se um ente querido pode precisar de tratamento, então, identificar estes sintomas é importantíssimo e podem salvar uma vida.
Não há uma receita onde todas as pessoas vão se encaixar, porque em cada ser os sintomas podem ser diferentes.
Um dos sintomas que devemos observar é o sono. Em alguns casos a pessoa tem distúrbios do sono e isso pode ocorrer tendo sono demais, insônia ou acordando frequentemente durante o descanso. Em ambos os casos, ao despertar, a pessoa se encontra cansada e sem ânimo para coisas que normalmente lhe traziam prazer.
Atividades que lhe traziam prazer começam a não ter mais tanto significado, o cansaço e a falta de vontade para sair de casa, se locomover a lugares onde antes lhe causavam sensações de felicidade não lhe animam mais.
Outro sintoma comum são dores no corpo, dores de cabeça, músculos, estômago, entre outras se tornam presentes. Um dos motivos é que neurotransmissores são inibidos e as pessoas com depressão ficam mais sensíveis.
A falta de concentração também é outro sintoma, atividades simples como assistir um filme ou prestar atenção em uma leitura as vezes se tornam complicadas, é como se fosse transportado a um lugar vazio, e está ali por alguns segundos ou minutos, como se tivesse se perdido, em um vácuo.
O que pode ajudar a lidar com a depressão?
Primeiro passo é procurar um profissional da saúde para orientação médica adequada.
Minha dica pessoal neste caso é que seja franca com seu médico, muitas vezes, por vergonha de admitir um trauma ou uma situação vexatória, mentimos sobre as causas e isso pode adiar a cura do seu tratamento por anos.
Traumas podem ser tratados com psicólogos, psicanalistas e psiquiatras, cada situação pode requerer um profissional específico para seu caso e ambos sabem te indicar conforme o problema for explícito a ele.
Há um enorme preconceito em relação a medicações para tratar problemas psicológicos, porém, uma medicação correta pode ajudar muito no equilíbrio de um bom tratamento.
Uma das melhores formas de tratar a depressão é, claro que mediante uma orientação médica, praticar atividades que adicionem prazer ao seu dia a dia.
Arte, atividade física como esportes, jogos, qualquer atividade, principalmente se trabalhar os músculos que causem prazer ao consulente.
A atividade física libera endorfina no organismo e isso vai trazer uma sensação de prazer substituindo momentos de depressão por momentos de conforto.
É difícil sair da zona de desconforto da depressão, mas, devemos analisar que, o caminho mais atrativo é piorar os sintomas e eles levam muitas pessoas a óbito. A depressão tira a vontade de viver, de interagir, de agir e necessita de atenção.
Lembrando que pode atingir desde crianças a pessoas idosas.
Se identificar pessoas no seu convívio que apresentam sinais de depressão, não seja indiferente, seja ação, ouça sem julgamento, ampare e ofereça suporte, marque uma consulta e acompanhe se possível incentivando ao tratamento.

quarta-feira, 7 de julho de 2021

Empatia

Ilustração por Gracia Lam para nytimes.com
 

Hoje, resolvi falar sobre empatia!

Há alguns dias tenho tentado analisar mais o meu comportamento em relação às pessoas.  Não sou de falar sobre seus defeitos, mas isso não significa que eu não pense neles. Pensando melhor... Eu me meto sim! Porque tento opinar quando acho que pode ser bom para o próximo e isso tem me feito refletir muito nestes últimos dias. Apenas tenho pra mim que cada um tem sua vida e é o único responsável por ela depois de se tornar adulto, ou seja, não costumo cuidar da vida alheia. Entretanto, eu penso na vida alheia. Sempre me coloco nas posições delas meditando sobre seus problemas e quando posso, eu tento ajudar.

Costumo sempre achar que os problemas das pessoas são simples de resolver, porém, tenho consciência de que isto ocorre pelo simples fato de eu olhar os mesmos sob uma ótica objetiva, trabalhando limpamente e observando do lado de fora e principalmente, baseada apenas na lógica e nas experiências que já vivi. 

Aconselhe alguém que se separe de seu companheiro que lhe faz mal, mas, se sentirmos a dor da pessoa, o conselho continua tão simples assim?

Por isso tenho pensado tanto no assunto. Venho conversando bastante com uma prima que têm gêmeos, e ambos têm feito terapia para tratamento de autismo. Minha prima não tem um diagnóstico ainda, mas analisando as dificuldades dela me vi várias vezes do outro lado. Faltando com empatia exatamente com outras mães que passam pelo mesmo problema. 

Ela relatou sobre um dia estar no Posto de Saúde e ter dificuldade em manter seu baby quietinho, entretido e sem chorar escandalosamente enquanto outras mães a olhavam com cara feia. 

Não fosse as conversas que tenho com minha citada prima, jamais diria que seu filho é autista. Não parece. Se olharmos atentamente para os meninos, não perceberemos diferença nenhuma de outras crianças, apenas se comportam de maneira diversa.

Posso ter, por diversas vezes olhado feio para uma "minha prima".

Depois dessa nossa conversa, eu me deparei com a mesma situação em um hospital e quando vi a criança aos berros e tentando bater na mãe eu apenas olhei pra ela e sorri. Não foi fácil fazer isso de coração, mas imaginei minha prima naquele momento.

De repente, essa mãe relaxou os ombros e sorriu pra mim, como se eu a entendesse, foi mágico aquele momento, mas ele não teria existido se não fossem horas de conversa com a minha prima Nê.

Isso me fez pensar em quantas vezes na vida não tive empatia; no trânsito, no transporte, na fila, na rua, e tantos outros lugares. 

A atitude positiva sempre traz resultados. É impressionante

Isso ocasiona o efeito bumerangue.

O que damos é o que volta pra nós. 

Trabalhei como cabeleireira por anos. É engraçado como normalmente as clientes me viam como se eu sempre fosse menos do que elas, mas quando percebiam que já viajei mais, ou que tinha mais estudo, mudavam seu comportamento imediatamente e de forma surpreendente. Começavam a me tratar como amigas, não eram todas as clientes que faziam isso, mas era muito comum.

Eu acreditava que elas precisavam de mim, não só para se sentirem melhores com sua auto estima fazendo cabelo, maquiagem ou uma sobrancelha, mas sempre me colocava pra ouvi-las, isso me rendeu experiências, sem precisar viver muitos fatos. 

Quando eu chegava, por diversas vezes, surpreendia clientes que estavam gritando com os filhos, falando de forma grosseira com as pessoas que as serviam, ou apenas com olhares fechados e sisudos, e eu logo dizia: Quer pegar uma água antes de começarmos? Seu celular? Pode aproveitar o momento pra relaxar, sempre ouvia como resposta um grande suspiro, um suspiro de alívio. E muitas vezes era seguido de um desabafo. Mães exaustas, avós cansadas, pessoas que tinham o meu serviço realmente como um momento de lazer. Lazer este que tem sido tão escasso. Cortar o cabelo virou lazer, por ser um cuidado.

Depois de ouvir, eu sempre perguntava o que lhes fazia bem, o que elas gostavam de fazer, mesmo que não tivessem mais tempo de fazer, elas sentiam a sensação prazerosa quando relatavam o que gostavam de fazer e isso trazia a sensação de bem estar.

Mães adoram contar as histórias dos seus filhos, o quanto eles as fazem felizes e também quanto às deixam exaustas, os maridos idem, mas ambos não têm mais saco de se ouvirem falar dos filhos. Pior que isso, também não tem tempo de conversar sobre outros assuntos que lhes fazem bem. 

Não é fácil se colocar no lugar dos outros, e não digo isso porque acho difícil me imaginar nas situações. O que acho difícil é analisar sentimentos. 

Hoje em dia se ouve falar muito sobre lugar de fala, acho que entendo melhor o que quer dizer.

Consigo compreender melhor a situação das mães que tem filhos com autismo, mas nem de longe consigo entender o que elas sentem de verdade.

Consigo entender o que uma mãe exausta vive, já passei por este lugar de fala, mas cada mãe vive sua exaustão pessoal, às vezes com um divórcio que não conseguem dividir, um câncer que ainda é segredo, um amor não esquecido, e tantas outras situações que desconhecemos. Mas ainda assim tanta gente tenta estar no lugar de fala. 

Julgar pela capa é no mínimo, injusto! 

Por isso vemos tantos grupos, tantas panelas, tantas comunidades. Transexuais, bissexuais, mães de autistas, mães solteiras, homens que traem, homens que jogam bola pra sair da espiral esmagadora, todos procurando um espaço pra serem compreendidos, pra dividir experiências, pra que o próximo, vivendo as mesmas situações, entendam seus motivos. 

Sempre me ponho a pensar que se eu conseguir ser empática com o que não seria meu lugar de fala, eu aprendi, eu evolui.

Quero ter empatia, quero conhecer outras histórias, quero saber, abraçar e sentir a satisfação daquele conforto, com aquela mãe, naquele hospital.


Agradecimento: Agradeço a Lucidio Bolivar Ramos pela edição de meu texto, somando a ele, sensibilidade linguística significativa e carinhosa. 


terça-feira, 23 de março de 2021

PAI DE MENINA

Hoje aconteceu uma cena que me colocou pra refletir pra variar, em mais uma noite em que não consegui pregar os olhos.

Estava me lembrando da aula on line da minha filha e na sua pausa, aproveitamos para, como todos os dias desde que ela nasceu, almoçarmos juntos, isso é importante pra mim, afinal, quantas famílias gostariam de ter esse privilégio e uma das coisas que me faz trabalhar em casa com prazer são as nossas refeições.

Após o almoço, minha pequena correu a geladeira pra pegar a torta de que ela fez com o pai um dia antes. Uma torta que foi feita por uma grande amiga em nossa casa, que minha filha amou e atualmente fazemos sempre que podemos, pois é, ela fez a torta com o pai ontem, um dia em que eu numa tarde extremo cansaço me puz na cama.

Sarah minha pequena, me vendo caída, pediu ao pai para me fazer uma surpresa e a surpresa foi, os dois na cozinha fazendo a torta. Ele, algumas vezes, foi ao quarto pois apanhava com a receita, tirava alguma dúvida do tipo como fazer claras em neve (risos), e, enquanto ela foi posta no banho, depois de um pequeno surto do pai, pra tentar fazer as claras virarem neve, fui a cozinha e bati as claras. 

A minha cara de feliz quando vi a torta pronta na mesa era nada, perto do sorriso dela em me mostrar a surpresa. Mas, voltando ao intervalo da aula, ainda tinha torta na geladeira e dividimos, após o almoço, o restinho que sobrou de ontem e estava deliciosa!

Sarah voltou a aula e disse: -  Professora, hoje está sendo um dia muito feliz na minha vida! 

A professora perguntou: - O que te fez tão feliz Sarah?

Este é o momento de contextualizar meu relato.

Tenho feito um livro de receitas com a Sarah, pra ela treinar a escrita e ter uma recordação de infância. Ela escreve cada receita que cozinhamos juntas, decora as folhas com pequenos adesivos, coloca a data da primeira vez que fazemos a receita, e vai para um grande fichário que tem crescido pelo menos a cada quinze dias.

Ontem brincamos de escolinha onde fiz pelo menos quatro atividades com ela de professora.

Jogamos Xadrez, que, por sinal ela está me ensinando.

Montamos casinhas para ela e para as bonecas nas pequenas folgas que tenho, feitas de caixas de papelão e guache, as vezes com colagens de papéis coloridos. 

Tem dias que montamos fantoches com caixas de leite, colorimos vários desenhos que ela escolhe a dedo, montamos jogos de tabuleiros com as regras inventadas pela Sarah. Ah! Mas uma das coisas que ela mais ama é plantar! Nós temos um quintal cheio de plantas e não há um vaso que ela não tenha ao menos apertado a terra. 

Neste momento eu parei, e num misto de orgulho e indignação olhei pro pai dela e disse: É justo isso?

Eu lavo, passo, cozinho, cuido quando tem febre, faço livro de receitas, vivo colando papéis e o dia mais feliz é quando ela come a torta que foi feita com o pai?

Ele riu e me perguntou: Você passa? 

Rimos juntos.

Sou uma péssima dona de casa, tenho que admitir.

Meninas; elas tem veneração por seus pais!

O pai da Sarah, que neste texto não vou falar do marido e sim do pai, é um pai muito presente. Ele brinca, ele também cuida durante as dores de garganta, pra ser franca ele faz curativo bem melhor do que eu, não sei lidar muito bem com os escândalos da Sarah a cada arranhão e normalmente tenho ataques de riso quando ela sofre por um furinho no dedo, já ele, coloca até Band aid. 

Me pus a pensar na minha mãe, que corria tanto na minha infância cozinhando, limpando, levando e buscando na escola, era ela quem batia na gente, ela era que parecia uma mocreia e eu tantas vezes tive raiva dela ser tão mandona, era ela quem nós disciplinava.  Mas quando meu pai chegava do trabalho eu corria pra tirar seus sapatos, pegar tudo que ele queria e ajudar pra que ele descansasse de um dia de trabalho. Ele sentava no sofá e minha mãe ainda tinha que cuidar da cozinha depois da janta. 

A gente não vê nada disso, é tão de costume, que não vemos como trabalho, o dia corrido que ela normalmente tem. E o carinho da comida quentinha, da toalha limpa na hora do banho, do cheiro do arroz quase pronto.

Hoje, quando vou visitar minha mãe eu só quero um prato da comida fresquinha, hoje eu vejo carinho quando ela cozinha, vejo carinho quando ela pica a laranja dizendo que preciso comer porque tem vitamina C. 

Me lembro da frase que sem querer já escapei pra Sarah algumas vezes... Quando você for mãe você vai entender. Eu preciso te ensinar o que é certo e o que é errado, doendo ou não. Quero que você seja uma boa pessoa quando for adulta! 

E naquele momento a Sarah respondeu a professora: Hoje é o dia mais feliz pra mim porque estou comento a torta que eu fiz com meu pai.

Fiquei com ciúmes quando a professora perguntou, eu sabia a resposta, mas fiquei feliz porque isso significa que ela tem um pai incrível, que é presente e que faz diferença na educação e na formação da minha pequena. 

Obrigada Oliver por ser um Pai de menina apaixonante.

domingo, 26 de julho de 2020

A violência e o abuso

Começo este texto falando sobre Pedofilia. Porque? Porque é a violência na primeira idade.
Claro que não acontece apenas com meninas, conheci casos onde meninos acreditam terem se tornado gays por conta da pedofilia, abusados e transformados por conta deste crime.
Quando falamos de pedofilia, logo imaginamos cenas de abuso infantil, cenas que nos chocam e nos encolerizam, cenas que nos ferem apenas de imaginarmos.
Agora eu quero que pense nos próximos 30, 40 ou 70 anos daquela pessoa que sofreu tal agressão.
As cenas da pedofilia duram minutos, horas, mas não acabam ali, se expandem por dezenas de anos. A vida desta criança é transformada, nunca mais um carinho será apenas um carinho, toda vez que essa pessoa é tocada, ela é transportada a sensações que muitas vezes não são identificadas mas carregam uma bagagem de desconforto.
A pedofilia precisa de terapia, não só na criança violentada, mas na adolescente que terá reações alteradas e desconhecidas, na adulta que terá problemas extremos de relacionamento e vai demorar pra associar a violência infantil, isso se um dia fizer essa associação, na mãe que terá loucuras aos cuidados destinados aos seus filhos, a avó que vai chorar desequilibradamente quando se der conta de como sua vida podia ter sido diferente. 
Um abraço de amigo poderia ter sido tão mais gostoso se não fosse o medo carregado de uma infância violentada.
Quando acaricio o corpinho da minha filha, sinto o desconforto de que, de alguma forma posso transportar pra ela a agonia que aquele toque é no meu corpo. 
Acariciar seu filho associando aquele toque a um abuso é triste. 
Quando você imagina que seu filho ou filha podem por um descuido viver uma violência, isso te enfurece, te torna leoa, te leva aqueles exatos momentos de infância que embrulham o estômago, aumentam seu batimento cardíaco, mudam a sua respiração e muitas vezes fazem seu coração doer. 
A questão é que isso acontece quando seu filho vai no colo de qualquer conhecido, quando seu filho entra na perua escolar, quando atrasa 1 minuto para chegar. Todas aquelas reportagens que reviram seu estômago que você ouviu nos noticiários se tornam uma insegurança que te faz sentir que vai infartar. E quando a perua escolar aparece lá no final da rua, sua perna perde a força e um alívio vai te trazendo de volta a realidade.
Eu só percebi que vivia essa angústia todos os dias da minha vida quando iniciei a terapia. 
Não fui violentada, sofri abuso! E minha vida nunca mais foi a mesma. 
Quando penso nas mulheres e crianças violentadas me enfurece, tenho vontade de lutar por elas, de dar as mãos e dizer, estou aqui, você não é mais tão frágil, conta com a minha força.
Pessoas violentas são covardes, se aproveitam da fragilidade de outro ser humano para se satisfazer, violentando, abusando, roubando uma infância, roubando a força, digo isso porque o homem que grita com sua esposa, a violenta também, ele só tem essa postura porque é covarde, o homem que inibe sua esposa criticando suas roupas, seu modo, seus conhecidos, outro covarde, se estas mulheres tivessem de mãos dadas, não teriam medo de enfrentar a covardia destes humanos desumanos. 
O medo de denunciar, o medo de se sentir abandonada, o medo de se sentir culpada mesmo quando se é vítima faz o silêncio de tantas mulheres, tantas crianças.
Não se cale, quando você assume, sem vergonha que foi vítima, descobre que não foi a única, descobre que não está só, descobre que a vergonha não deve ser sua e sim do desumano que a abusou. Ele é culpado, ele é errado, ele é agressor.
Eu sofri pedofilia, e depois que resolvi dizer isso sem ter vergonha, descobri que no meu pequeno núcleo em média 80% das mulheres que conheço também foram abusadas ou violentadas sexualmente, não é agressão verbal não, é física! Você ganha uma mão, você fica mais forte. Nós somos mais fortes juntos.
Brigamos por um mundo melhor, alertamos para que a próxima geração tenha menos de um sentimento tão ruim e que não dura apenas no ato, é levado para toda uma vida.
Você ouviu seu vizinho agredir a esposa? Denuncie! Não permita! Não se cale! 
O seu silêncio dá força ao agressor e não a vítima que precisa de amparo. 
Me dê a mão, e ajude tantas mulheres, tantas crianças, tantos gays, lésbicas, transexuais a se sentirem amparados. Não aceite a piada que discrimina, não aceite o desrespeito, amanhã, esse mesmo agressor, pode estar do lado de quem você ama! Faça pelo próximo, para que o próximo faça por você. 

quinta-feira, 9 de julho de 2020

Zinha e sua boneca com olhos de vidro e unhas para pintar


Pequena e insegura ela vê as águas do rio correr.
Sua mãe está longe, seu pai morto, sua família doente.  A febre tifo dizimava e as águas continuavam correndo. Quantas vezes as águas do rio levavam as roupas que ela lavava ali, e assim buscando-as, ela aprendeu a nadar. Não podia perder as roupas caras que nunca seriam suas.
O dia começava cedo, bem longe dali a mãe já limpava casas, e buscava a todo desespero, comida para quatro crianças pequenas, com dez, oito, seis e quatro anos. Tão pequenas e sem força, mas ao mesmo tempo tinham que ser adultas pra se protegerem enquanto a mãe buscava o alimento.
Quase instintivo, quase primitivo, tão duro e tão cruel. Era assim a vida de uma família que ficou para sobreviver naquela cidade da Bahia.
 A mãe chegava quando o sol estava indo embora, as crianças já limpas, alimentadas da farinha que era feita na própria terra e as roupas que havia trazido na noite anterior, sua filha já havia lavado, engomado e estavam prontas para serem entregues as clientes da cidade.
Brincar? Não havia bonecas! O máximo que conseguiam eram ossos de gado, que muitas vezes eram amarrados aos cabelos do milho e viravam lindas donzelas passeando na terra.
O sol acordava as crianças, pois a mãe já estava longe, não podia ter esse luxo.
Sonho? Era possível ter sonhos num lugar desses? Sim, quem sabe um dia o pai não voltava da cidade com as latas de bolacha enormes que trazia sorrisos no rosto daqueles pequenos.
Mas a Zinha tinha um sonho, ter uma boneca com cabelos de verdade.
Se aos seis já lavava as roupas no rio, aos oito era babá em “casa de família”. Cuidava de duas crianças para a patroa trabalhar o dia todo fora.
Enquanto isso, ela cozinhava, fazia a limpeza da casa e deixava seus dois filhos impecáveis para ela curtir quando voltasse do trabalho.
Quanta responsabilidade para uma criança de oito anos. Sem erro, sem medo!
Mas certo dia a saudade foi maior, ela esperou o dia de folga da patroa e fugiu, sertão adentro atrás da sua família, e chorou pedindo a mãe que a escondesse, pois não queria mais ficar longe.
OITO anos!
Ela tinha uma mãe má? Não!
Só quem conheceu sua mãe pode dizer sobre este serzinho de um metro e cinqüenta que amava tanto, como se não houvesse o próximo minuto.
Uma mãe desesperada, que ficou com cinco filhos para criar, sim; cinco filhos, mas um se foi pequeno ainda, morto por um “golpe de ar”.
Tinha que ser muito forte pra sobreviver naquela situação e a menina de dez anos se sentiu culpada por muito tempo, mas se a consciência dela tivesse estudo ou um mínimo de cultura, essa culpa não existiria.
Zinha disse:
Minha vida daria um livro!
Sim. Daria uma série, com temporadas e mais temporadas de lição de vida a tantos leitinhos com pêra que conhecemos em 2020 que nem sabem o que é uma cacimba.
Ah! A Cacimba. Era tão mais fácil quando foi trabalhar perto da cidade e a roupa era lavada na cacimba. Lá não precisava nadar quando a roupa corria nas águas.
Voltando ao sonho da Zinha, ter uma boneca com cabelos louros, boneca que piscava, tinha roupas de tecido e mãos que ela poderia pintar as unhas.
Zinha também teve problemas de saúde na infância, por ser asmática, tomou muita “surra de folha” pra sarar, tomou tanto chá que hoje conhece bem as ervas. Os vizinhos choravam quando a viam apanhar para passar a asma, mas; o desespero da falta de atendimento faz uma mãe recorrer à simpatia, mesmo doendo, ela batia, até “despelar” o galho. E Zinha voltava a respirar.
Um dia sua mãe a levou no médico, um dentista. Ela precisava tirar seus dentes de leite. Todos eles!
Não! Não dá!
Duas horas caminhando mais duas horas na carroceria do caminhão pra chegar à cidade e fazer a cirurgia, e depois ainda tinha às seis horas de volta.
Mas a mãe prometeu a boneca, e ela aceitou.
Seu sonho tinha uma forma de se realizar.
Ela tirou todos os dentes!
Voltou pra casa. A mãe prometeu que em outro dia buscaria a boneca. E ela, contava os dias pra boneca chegar.
Mas a mãe nunca conseguiu comprar.
Zinha esperou, cresceu, casou.
Morando em São Paulo, na luta ainda de uma vida de conquistas, sua terceira filha completou sete anos e uma tia, a presenteou com uma boneca que era de sua mãe.
Cunhada de Zinha, de pouco contato, estava se desfazendo de coisas antigas.
Sabe o que Zinha viu entrar na sua casa?
Sua boneca!
Trinta anos depois ela piscava, tinha cabelos loiros, roupas de tecido e unhas para pintar.
Zinha limpou, penteou seus cabelos, e se desculpou com sua filha que não poderia brincar.
Enquanto ela pintava as unhas via as águas do rio correr, a terra vermelha levantar pó, as roupas das clientes balançarem no arame farpado a secar, as crianças lindas que ela ajudou a cuidar, o final da tarde que trazia sua mãe de volta pra casa, à lata de bolacha... Ah! A lata de bolachas.
Tantas lembranças, tantos ensinamentos, tantas histórias que hoje, quem conta pode afirmar: Medo não cabe a Zinha! Ela é guerreira, ela é forte, ela é a mãe que penteia a boneca.